quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Uma vez na faculdade... #5

Matthew Killinsgworth, um estudante de doutoramento em psicologia de Harvard e o seu mentor Daniel T. Gilbert, num artigo publicado na revista Science deste mês de Novembro, intitulado "A Wandering Mind is na Unhappy Mind", concluem que o preço a pagar pela capacidade humana única de estar a pensar noutras coisas para além do que está a acontecer no momento, é tão só o preço da infelicidade. Dizem eles: "a human mind is a wandering mind, and a wandering mind is an unhappy mind". Seremos então infelizes por passarmos pelo menos 46,9% das horas em que estamos despertos, a pensar noutra coisa para além daquilo em que estamos a fazer? A pensar naquilo que já passou, que teríamos mudado ou que teríamos mantido tal e qual como aconteceu, a pensar naquilo que gostávamos que acontecesse ou que tememos que venha a acontecer?

Parece que este nosso modo de funcionamento por defeito não nos traz muito benefício: os investigadores contactaram 2500 voluntários, em diversos intervalos, para responderem quão felizes estavam com a actividade que estavam a desempenhar no momento, entre 22 actividades, como comer, passear, fazer compras ou ver televisão. Em média, responderam que os seus pensamentos divagavam em quase metade do tempo, e não menos de 30% mesmo quando estavam envolvidos noutra actividade, à excepção da actividade sexual, do exercício físico ou da conversa. Os momentos mais sombrios ocorriam quando as pessoas estavam a trabalhar, a ver televisão ou a usar o computador em casa. Parece então que o presente não interessa muito a ninguém, excepto quando há exercício físico envolvido, interacção humana ou ... ambos ...

O que é interessante, é que este hábito de divagação em que pelos vistos somos todos de algum modo viciados, é um excelente preditor do nosso grau de felicidade, não só por meramente acontecer, mas também em virtude do modo como acontece. Isto porque para além de deixarmos os nossos pensamentos escapar ao nosso controlo, interessa também saber para onde os deixamos escapar. Com efeito, o sítio onde estão os nossos pensamentos na maior parte das vezes, indica em 10,8% se nos sentimos felizes ou infelizes. E é importante sublinhar que estas divagações, de acordo com o estudo, são a causa e não a consequência do nosso mal-estar.

Ora, o tipo de divagação de que fala Killingsworth partilha muitas semelhanças com o tipo de pensamento típico dos indivíduos com depressão. Os resultados de uma experiência realizada por Smallwood e outros (2007), indicam que o grau de divagação (mind-wandering) em que um indivíduo se envolve, constitui um importante marcador para a identificação de um tipo de pensamento depressivo e sugere uma série de implicações para a terapia da depressão. Numerosos estudos correlacionais, longitudinais e experimentais demonstraram que o auto-foco ruminativo prediz, aumenta ou mantém o humor negativo em pessoas deprimidas e que a distracção, em contrapartida reduz o humor deprimido. Ou seja, a técnica de paragem de pensamento pode ajudar estas pessoas a alterarem o foco de atenção do sítio onde se encontra para lugares mais felizes... E que tentar não pensar em alguma coisa em que nunca se pensou antes (um urso polar) é muito diferente de aprender a desligar um pensamento disfuncional que ocorre vezes sem conta.

Parece que a conclusão a retirar daqui é que só a atenção devidamente focada pode produzir bem-estar e que afastarmo-nos do que nos preocupa é que traz ganhos em termos de saúde mental.

Respondi assim:

"O que me aconteceu ao ler este post foi que os meus pensamentos voaram (divagaram!) imediatamente para a minha própria experiência.

E pensei, claro está, se isto de me perder tantas vezes nos meus pensamentos poderia estar, realmente, a fazer de mim uma pessoa menos feliz.

Claro está que ninguém gosta de admitir essa ideia, mas não é isso (ou não é só isso) que me faz pensar que não será bem assim como estes autores afirmam. Consigo conceber que haja uma série de actividades da nossa vida que não serão tão bem aproveitadas quando a cabeça se passeia por outro sítio e daí advém, necessariamente, menos prazer imediato e, a longo prazo quem sabe, o arrependimento pelo que passou e podia ter sido aproveitado e não foi. Neste caso, será necessário que a pessoa consiga aprender a desligar e encontrar, em si, estratégias que lhe permitam ir saboreando cada momento e tirando dele o maior dos proveitos. E acredito, verdadeiramente, que todos temos em nós a capacidade (mais ou menos bloqueada) de seleccionar aquilo que nos será mais relevante e em maior escala contribui para a nossa felicidade e desenvolvimento.

Porém, a felicidade passa também pela aceitação de que há coisas, experiências e momentos da nossa vida que nos serão penosos, que nos custarão a suportar e carregar. E, aí, não será uma bela arma de defesa a nossa capacidade (tão humana) de nos evadirmos e, sem pestanejar nem nada indiciar, viajarmos para longe, onde tudo é melhor e mais suportável... Posso estar enganada, mas não é isto que vamos pedindo aos nossos pacientes com algumas "técnicas" (ah, que nome este) que vamos aplicando com quem nos procura? A capacidade de imaginar, sair dali, se colocar em sítios que não aqueles e ver estímulos que não os que temem. E aquelas pessoas que só vão tolerando o único trabalho que conseguiram arranjar para dar de comer aos filhos, exactamente por se conseguirem abstrair da sua rotina enfadonha e ir passeando pelos jardins do seu pensamento?

E a confusão que me faz a afirmãção de que "o presente não interessa muito a ninguém"?... afinal, o que é o presente? É o segundo em que estamos? Ou é a actividade em que nos envolvemos? Ou é contado por dia, cada 24h é o presente... é tão relativo. Não consigo mesmo pensar, na graça do momento presente sem o comparar com momentos passados ou lhe dar valor no futuro. O presente não interessa a ninguém, vai interessando a todos. Porque é dele que depende a qualidade do que vamos designar como passado, a partir dele que avaliamos o futuro.
Então e se a divagação do momento presente for relacionada com o modo como melhorar o futuro? Isso não conferirá uma certa esperança e entusiasmo que nos permite, mais tarde, afirmar maior felicidade?
E se as pessoas que foram respondendo a estas perguntas estivessem, também elas, com a cabeça noutro sítio?"

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